João Cerqueira: “rejeitaram-me livros que venceram prémios internacionais”

O escritor vianense João Cerqueira é, aos 55 anos de idade, o único escritor português vivo que já venceu quatro diferentes prémios nos Estados Unidos, foi referido em títulos da imprensa internacional como o Wall Street Journal, USA Today e New York Times e tem obra publicada em diversos países da Europa e da América.

Autor de best-sellers como, por exemplo, o romance Jesus and Magdalene, que venceu, no INDIE READER AWARD’S 2020, a categoria Humor – o júri considerou-o uma intensa e hilariante paródia da vida moderna, escrito com grande qualidade literária – é, todavia, praticamente desconhecido no seu país e, inclusive, na sua terra.

Em entrevista concedida ao A AURORA DO LIMA, não se furtou às questões por nós colocadas.

É autor de quase uma dezena de livros, com obra publicada em Espanha, Itália, Inglaterra, França, Argentina e Brasil. Quando e como começou a sua apetência pela literatura?
O meu pai, João Delgado Cerqueira, tinha uma excelente biblioteca com mais de quatrocentos livros. Os principais clássicos da literatura, assim como as obras contemporâneas, estavam lá. Havia livros proíbidos pela censura – em francês e inglês – e havia discursos de Salazar. Desde de pequeno que fiquei a conhecer nomes como Xenofonte, Cervantes, Stendhal, Chateaubriand, Stefan Zweig, Tolstoi,etc. Obviamente que não os lia, mas olhava para aqueles livros fascinado como se estivesse diante de algo mágico. O gosto pela literatura começou assim.

Fale-nos um pouco de como tem sido a sua atividade literária e do seu maior bestseller A Segunda Vinda de Cristo à Terra?
A minha actividade decorre sobretudo nos EUA onde há semanas venci o Indie Reader Awards com A segunda vinda de Cristo à Terra. O livro nasce da vontade de dar continuação às aventuras de Jesus na Terra que começam com A Tragédia de Fidel Castro. A ideia principal é a de que se Ele voltasse de novo para o meio dos homens, estes trata-lo-íam tal como da primeira vez. Levado por uma Madalena moderna, Jesus tenta pacificar os desavindos, mas apenas consegue enfurecê-los mais. Além de satirizar o nosso país, o livro é, pois, uma homenagem a Jesus Cristo – sem ele, não haveria nem liberdade, nem igualdade, nem democracia. Aproveito para agradecer publicamente ao Padre Coutinho – um grande homem a quem a cidade muito deve – por ter divulgado o livro no jornal da Paróquia da Senhora Fátima.

Atualmente a sua atividade na escrita é já de uma forma exclusiva?
Não. Dou aulas na Escola Superior de Educação, faço a gestão do património da família, cozinho e – o maior e mais importante dos trabalhos – educo uma filha.

É o único escritor português vivo que vence quatro distintos prémios nos Estados Unidos e tem obra publicada em Espanha, Itália, Inglaterra, França, Argentina e Brasil, mas foi rejeitado pelas editoras nacionais. Aliás em Portugal e, mesmo, em Viana do Castelo, terra onde nasceu e vive, não é conhecido. Porquê?
As editoras rejeitaram-me livros que venceram prémios internacionais e estão publicados noutros países. E o mais estranho é que eu – português, nortenho e minhoto – escrevi para leitores nacionais. Nos meus livros está a cultura vianense – como o mar, o bacalhau, o cozido à portuguesa, as chouriças e o vinho verde, assim com a Praça da República e os Paços do Concelho. O romance 25 de Abril, corte e costura decorre numa cidade imaginária, mas que na verdade é Viana do Castelo. Sempre que posso, presto homenagem à minha cidade: à sua história, aos seus edifícios históricos, à sua natureza e gastronomia.
Não sou conhecido porque os jornais e as revistas de literatura não divulgam a informação acerca dos meus prémios e traduções. A censura continua a existir em Portugal. É a minha vez de dizer: foi para isto que se fez o 25 de Abril?

Também na sua Viana do Castelo é ignorado, nomeadamente, pelas instâncias culturais. Como lida com isso?
Só comecei a ser excluído depois da Dra. Flora Silva – uma grande senhora que sempre me apoiou – deixar o pelouro da cultura. Nunca mais fui convidado para nada: nem para a feira do livro, nem para as tertúlias literárias ou conversas com escritores – apenas o Centro Cultural do Alto Minho divulga o meu trabalho. Esta situação entristece-me e em nada dignifica os responsáveis pela cultura em Viana do Castelo. Porém, tenho a certeza que com a saída da responsável por este ostracismo tudo irá mudar. Afinal, sou o único escritor português que ganhou prémios nos EUA, sou vianense e tenho muito orgulho na minha cidade.

Disse, recentemente, que a cultura é dominada por uma esquerda caviar que exclui os que não alinham pela cartilha e uma coutada de amigos subservientes do poder. Será mesmo assim… o Lobo Antunes, por exemplo, não será da dita esquerda caviar?
Por Esquerda Caviar designo aqueles que criticam o sistema capitalista enquanto disfrutam dos seus benefícios. Qualquer pessoa que tenha um telemóvel, um computador ou um cartão de crédito é um financiador do capitalismo. Os caviares são semelhantes ao bispo que prega moral e depois vai ter com a amante. A cultura é realmente dominada por uma esquerda chic lisboeta que janta nos melhores restaurantes e passa fins-de-semana em Paris. São intolerantes com quem os satiriza como eu. Além disso, quem não estiver em Lisboa não existe.

Como qualificaria a sua escrita literária e quais as suas principais referências?
A minha escrita é influenciada por Eça e Camilo. Uso o humor e a sátira para abordar temas actuais que interessam a toda a gente. 25 de Abril, corte e costura trata do divórcio entre a política e os cidadãos, e de temas fraturantes como o casamento homossexual e a tourada. Os leitores de Esquerda irão rir-se dos de Direita, e vice-versa.
Gostaria que todos os vianenses lessem o livro.

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