“Se tivéssemos aceitado esse projeto, teríamos um elefante branco encalhado”

Em entrevista exclusiva ao jornal “A Aurora do Lima”, o responsável máximo da Martifer/ WestSea reconhece as dificuldades iniciais, mas revela a opção acertada na rescisão do contrato com a Venezuela. Com experiência no mercado daquele país, Carlos Martins conta que o negócio, em teoria, tinha viabilidade económica, mas “achámos que tinha tudo para correr mal”.

O empresário sabe que tem os holofotes apontados e não esconde a vontade de tornar os estaleiros uma referência. Consciente da necessidade de obras para que maiores navios possam entrar e ser construídos nos estaleiros está a negociar com a Administração dos portos de Douro, Leixões e Viana (APDL) o prolongamento da concessão por mais 25 anos.
Carlos Martins fala dos projetos de futuro, que passam pela construção de mais navios para circular no Douro e nos polos. Mas não esquece a área da reparação naval.

A Aurora do Lima (AAL): Está na liderança dos estaleiros WestSea desde 2014. Que balanço faz destes cinco anos?
Carlos Martins (CM): Faz precisamente este mês cinco anos. Nós fazemos um balanço muito positivo.

AAL: Chegaram numa altura muito complicada. Considera que esses problemas já estão ultrapassados?
CM: Este é um projeto que está a correr muito bem, porque encaramos isto como um grande desafio e estava na consciência das pessoas que não podia correr mal. Os estaleiros estão sempre com os holofotes apontados e a nossa chegada cá não foi muito pacífica, por isso não havia espaço para que corresse mal. Acho que correu bem, porque soubemos encontrar um caminho para os estaleiros. Tivemos de dizer que não a algumas coisas. Quando chegamos, havia um projeto para fazer dois navios para a Venezuela e recusamos.

AAL: Com encargos muito significativos.
CM: Se tivéssemos aceitado esse projeto, apesar de haver uma expectativa, e em teoria esse projeto tinha uma perspetiva económica interessante, mas nós, que já tínhamos estado expostos à Venezuela, achámos que tinha tudo para correr mal. E se tivéssemos aceite esse projeto teríamos um ou um meio elefantes brancos encalhados, porque nem espaço temos para aparcar navios e teria corrido muito mal.

AAL: Vocês enveredaram por outra linha?
CM: Especializámos o estaleiro, aproveitámos a sabedoria que havia. Recuperamos clientes no setor da reparação naval e no setor da construção naval tentamos servir a Marinha e os projetos do Dr. Mário Ferreira. Conhecíamos a vontade dele em projetar a empresa para os polos e lançámos-lhe o desafio para que construíssemos o navio para a Antártida e para o Ártico. Encontrámos um caminho para competir com os estaleiros europeus. Na primeira semana de junho vamos entregar o navio “MS World Explorer” e a partir daí…

AAL: Já tem mais encomendas de navios desse género?
CM: Sim, os próximos quatro/cinco anos estão completamente garantidos.

CANAL DE ACESSO PARA MAIORES CALADOS

AAL: A dificuldade é construir navios de maior calado pela pouca profundidade do canal de acesso?
CM: Temos um projeto de alargamento e simultaneamente há uma promessa nossa de fazer uma doca de 200 metros por 40, que permite receber navios maiores, sobretudo para efetuar manutenção.

AAL: Esses projetos é para avançar em breve?
CM: Vamos avançar com as obras logo que tenhamos firmado com a APDL o contrato que nos permite estar aqui mais tempo, para que este investimento que temos planeado possa ser amortizado. Nós só temos concessão por mais 12 anos. Ou conseguimos prolongar essa concessão ou então não faz sentido fazer esse investimento.

AAL: E o número de trabalhadores. Falamos de quantas pessoas?
CM: Nossos são cerca de 400. Neste navio do Dr. Mário Ferreira, o “MS World Explorer” tivemos cerca de 1300 trabalhadores, que são contratados à tarefa.

AAL: A WestSea ficou com antigos trabalhadores dos estaleiros.
CM: Dos trabalhadores que anteriormente trabalhavam alguns foram para a reforma e outros ficaram connosco. Na construção deste navio, além dos nossos trabalhadores, julgo, tivemos pessoas de 30 e tal nacionalidades.

AAL: Os estaleiros eram uma referência na região. Acha que já estão outra vez nesse caminho?
CM: Isso é uma pergunta que lhe faço a si (risos). Mas eu acho que sim. Essa não é a nossa principal preocupação. Sabemos que o estaleiro é fundamental para a região e para a cidade, mas obviamente que uma cidade não pode depender do estaleiro, porque qualquer azar que aconteça pode contaminar a região.

AAL: Considera que mais empresas deveriam surgir ligadas à indústria naval?
CM: Dos 1300 trabalhadores que colaboraram na execução deste navio, a maioria trabalha em empresas fora dos estaleiros, desde o mobiliário à decoração.

AAL: Vocês fazem questão de procurar fornecedores da região?
CM: Sim, e até fazemos isso de uma forma natural. Hoje o produto português tem qualidade e é competitivo.

AAL: Projetos para os próximos tempos?
CM: Vamos ter mais navios para o rio Douro. Teremos, possivelmente, a construção de um por ano. Os navios para o Ártico seja para o Dr. Mário Ferreira seja para outros clientes poderemos entregar um por ano. Concorremos ao concurso da Marinha para mais seis navios e queremos, naturalmente, ganhar. Com o aprofundamento do canal e com a nova doca sabemos que podemos ir buscar navios de maior porte para que possamos crescer no segmento da reparação naval. Quanto maior é o navio mais rentável é a operação de manutenção. Queremos investir na inovação e nas infraestruturas para dar mais qualidade de trabalho.

 

Foto: Dinheiro Vivo (DR)

Item adicionado ao carrinho.
0 itens - 0.00

Ainda não é assinante?

Ao tornar-se assinante está a fortalecer a imprensa regional, garantindo a sua
independência.