Aprender a ser infeliz é a nova condição humana?

Natacha Cabral
Natacha Cabral

O mundo tem uma alma. Um povo tem uma alma. O leitor tem uma alma. Pode-lhe parecer estranho estes conceitos, mas deixe que me explique.

Há coisas que nem o próprio tempo apaga, independentemente de quantas gerações tenham caminhado entre nós. E uma dessas coisas chama-se memória coletiva. 

É curioso esta disputa entre civilizações. Não é de hoje e, na verdade, parece nunca mais ter fim. É como se encontrássemos um mundo dividido em duas frações: de um lado, um mundo onde se defende a igualdade e a equidade, e do outro, um mundo que reivindica o nacionalismo e ignora as diferenças sócio-culturais.

Mas a história de uma nação ou de um povo jamais poderá ser esquecida. Não é por acaso que, de um modo geral, um russo seja mais frio que um espanhol, nem que um brasileiro seja mais alegre que um chinês, ou até que um italiano seja mais expressivo que um português. Nada é ao acaso. E tudo se prolonga no tempo. Por muito que gostássemos de ignorar o sangue frio, quente, disciplinado ou liberal que nos corre nas veias de acordo com o lugar onde nascemos, essa é uma tentativa fracassada de não aceitar as nossas origens ou as tragédias passadas que ficaram registadas no tempo e no espaço.

Não consigo ver este multiculturalismo como algo prejudicial. Muito pelo contrário, o mundo precisa do rigor do povo alemão, da mesma medida que precisa da vivacidade do povo brasileiro. Num lugar onde a diferença faz a força e é incontestavelmente necessária, seria um grande erro conferir maior ou menor importância às variadas culturas.

E é aqui que caímos no paradoxo existencial: seria realmente necessário o sofrimento causado por um Hitler, um Estaline ou um Salazar? Serão os alemães menos merecedores que nós? Ou os americanos mais importantes que os iranianos?

Creio não se resumir à importância mas à necessidade e à tolerância das suas existências.

Todos fazemos parte de uma tela maior, e nada do que aconteceu poderá ser refeito ou esquecido. Neste mapa-mundo não há vencedores nem fracassados, relevantes ou insignificantes. Todos fomos. Todos somos. E é fundamental que se respeite estas diferenças, não só nos padrões comportamentais como nos padrões emocionais. Seremos sempre diferentes na nossa igualdade. Carne e osso é aquilo que nos assemelha. Vivências e memórias é aquilo que nos distingue. 

Tudo isto para dizer que talvez devêssemos aprender com o passado, aceitando de onde viemos e procurando, incessantemente, contribuir para um futuro melhor. Para um futuro de maior compreensão, de bondade, de respeito e de esperança, ao invés de um futuro de separação, de segregação e de corrupção, dominado pelo medo e pelo ódio, e por falsas ideias de supremacia e superioridade.

A cura só acontece quando o amor tem lugar destacado. A aceitação é, pois, o primeiro passo para a liberdade, e para a felicidade coletiva.

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