Aventuras, descobertas ou viagens

Carlo F. Sampaio
Carlo F. Sampaio

Anda a opinião pública entusiasmada e entretida a discutir o nome para um museu, assim como o significado das “Descobertas” e eu próprio não estou a conseguir escapar.
Confesso já ter sentido alguma saturação quanto à evocação destas glórias passadas, achando exagerada a dependência da imagem do país de algo ocorrido há cinco séculos.
No entanto, é importante reconhecer que estas viagens, descobrimentos, ou lá o que se queira chamar, constituiriam uma das primeiras e maiores empresas científicas da humanidade. Não se tratou de uma expedição voluntariosa pontual, que podia ter acabado bem ou mal. Foi um programa organizado e gradual de construção de conhecimento ao largo de décadas. Foi ir, recolher informação, regressar e consolidar para a seguir ir mais longe. Tivesse o nosso país uma dimensão económica e cultural de primeira linha e não faltariam por aí filmes, séries e estórias sobre essa história.
Inocentes, não houve e nunca há, mas colocar a escravatura como uma consequência principal dos descobrimentos e assim apelar à sua desvalorização é uma infantilidade. A escravatura, que ninguém em perfeito juízo pode hoje defender, não foi inventada pelos europeus nem foi exclusivamente a transatlântica. Para quem se quiser informar não lhe faltarão fontes, quem preferir apenas acreditar, que o faça, mas assumindo tratar-se duma questão de fé. Podem sempre aproveitar para denunciar e lutar contra a escravatura declarada ou de facto que hoje ainda existe.
Colonizamos e dominamos, se bem que o mais o mar do que a terra? Sim, o processo histórico está repleto de guerras e conquistas. Por exemplo, este nosso jardim foi conquistado e colonizado pelos romanos, que não terão cá chegado com um ramo de oliveira em cada mão e esse período significou um enorme avanço civilizacional. Ninguém está a pensar em exigir desculpas aos italianos, seus herdeiros, pelas violências associadas, pois não? Não, somos crescidos!
Por último, pensemos nas pessoas anónimas que viveram essa campanha, que tantos sofreram e tantas que nela morreram. Não merecerão elas uma erudição e um reconhecimento justo e adulto pelo esforço enorme que fizeram pelo seu país? Ou o facto de lermos alguns acontecimentos dessa época com lentes dos dias de hoje justifica dedicar-lhes o nosso desprezo?

(Foto: “RTP Ensina”)

Outras Opiniões

Os leitores são a força e a vida do nosso jornal Assine A Aurora do Lima

O contributo da A Aurora do Lima para a vida democrática e cívica da região reside na força da relação com os seus leitores.

Item adicionado ao carrinho.
0 itens - 0.00

Ainda não é assinante?

Ao tornar-se assinante está a fortalecer a imprensa regional, garantindo a sua
independência.