Europa em ebulição

A. Lobo de Carvalho
A. Lobo de Carvalho

Não pensava voltar a referir-me, tão cedo, ao conflito armado que ocorre no Leste da Europa, entre a Federação Russa e a Ucrânia, mas o facto é que a evolução dos acontecimentos, com especiais reflexos nos países da União Europeia (UE), é demasiado grave no momento que atravessamos, projectando-se mais perturbadora, ainda, no futuro próximo. Por essa razão, sinto que não posso deixar de erguer a minha voz contra certas opções, tanto da UE como dos governos dos países, materializadas não pela racionalidade, mas antes pela cegueira política com que teimam marcar o nosso destino colectivo.

Julgo que a opção mais disparatada da UE, em conjunto com os norte-americanos, foi, sem dúvida, a imposição de todo o tipo de sanções à Federação Russa, na convicção de que esta ficaria isolada e frágil, economicamente, e que acabaria por ceder ao pensamento político ocidental. Nem sequer se pensou no reverso da medalha, isto é, nos efeitos desastrosos que tais sanções trariam aos povos da UE, e hoje confrontamo-nos com esta realidade que ainda só vai no início. Entretanto, e pesem embora as consequências dos pacotes das sanções, o poder político russo tem sabido tornear a situação difícil que lhe foi imposta, conseguindo manter os meios económicos e financeiros essenciais para suportar o esforço do combate no campo de batalha, ao mesmo tempo que evidencia níveis aceitáveis de conforto para os seus cidadãos.

A realidade para os povos europeus alterou-se substancialmente com a subida dos preços do gaz, electricidade, combustíveis e diversos bens essenciais de consumo, a que se juntarão outros graves problemas com o advento das estações mais frias. Os políticos ocidentais que nos comandam, quais cavaleiros do apocalipse, foram e continuam a ser absolutamente imprudentes ao fazerem todas as vontades ao sr. Zelensky, ao mesmo tempo que ignoraram os efeitos que adviriam para os seus povos. A enorme abrangência das sanções foi um erro, considerando que era mais que expectável que a Federação Russa retaliaria, como de facto aconteceu através da materialização no corte do fornecimento de gaz. Com os pacotes de sanções, a União Europeia, no conjunto dos seus órgãos políticos, decidiu que iria fazer implodir a Federação Russa, mas os estilhaços vieram cair no seu território, causando o sofrimento a milhões de pessoas que em nada contribuíram para esta situação. 

Quando se diz que para os órgãos de poder da União Europeia são escolhidos os cidadãos com inteligência acima da média, eu responderia que é uma falácia, porque a realidade mostra que não evidenciam maturidade, reagem a quente e não estudam nem sabem prever as consequências das suas decisões, lamentando-se depois que o governo russo retalie com os seus meios disponíveis, que, neste caso, foi o corte do gaz. Isolar a Federação Russa da forma como os governos ocidentais o têm feito significa uma humilhação que os dirigentes russos, actuais e futuros, jamais irão esquecer e penso mesmo que nunca haverá uma paz verdadeira entre dois blocos antagónicos. Entretanto, a UE viverá no fio da navalha, pela sobranceria e incompetência política dos seus dirigentes, correndo a eventualidade de uma implosão. 

Lamento profundamente que a UE não possua governantes compatíveis com um alto nível de exigência política e perfil de verdadeiros estadistas. E perante os problemas que não souberam evitar, há que reconhecer que os governos que estão a furar as sanções demonstram coragem e responsabilidade, porque a sua função primária é proporcionar o bem-estar aos seus cidadãos e não alimentar a guerra e os interesses. Claro que correm alguns riscos ao desviarem-se do politicamente correcto, mas assumem-no com coragem sem terem de seguir a cartilha à letra. Não se deixando levar pela cegueira generalizada, demonstram que os seus cidadãos estão no topo das preocupações, tendo sido para os proteger que foram eleitos! 

Deseja-se um fim rápido do conflito, quando é certo que poderia nem ter começado se a Ucrânia tivesse permitido o referendum nas repúblicas, cujas populações não possuem alma ucraniana e desejam pertencer à Federação Russa. Na altura em que escrevo estas linhas estão a decorrer essas consultas populares, e os resultados, gostem ou não os países que se opõem, serão tidos como válidos pelo governo russo. Para os governos ocidentais, incluindo o nosso, constitui um forte murro no estômago, porque acontece exactamente o contrário daquilo por que se têm batido. 

Considero positivo que as nações europeias vão reagindo através de manifestações e despeçam sem glória, por meio de actos eleitorais democráticos, os governantes que as desprezaram, elegendo outros com um pensamento político lúcido e com engenho e arte para ajudarem no fim ao conflito armado, através do diálogo, e não com sanções e fornecimento de armas. As eleições gerais na Itália poderão constituir um bom lenitivo.

Para concluir, diria que o planeta está à beira do abismo e a humanidade caminha para a autodestruição, não só porque demasiadas situações imprevistas aconteceram e continuam a acontecer, mas, sobretudo, porque se rejeitou e retirou Deus da esfera pública, quando é certo que Deus nos criou para viver em harmonia com Ele e com toda a criação. Os documentos constitutivos da UE ignoram o santo nome de Deus e isso é uma declarada afronta. Deus não dorme!

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