Idosos: a hipocrisia das prioridades no atendimento

Mário Frota
Mário Frota

“Tomo Lisboa em trânsito para Itália, em voo da transportadora aérea portuguesa.
O voo de conexão estaria aprazado para cerca de cinco horas mais tarde.
Longas filas na polícia de fronteira, em Lisboa.
A conferência dos passaportes tardava.
Como em idade de beneficiar da prioridade, deslocámo-nos para a fila respectiva.
Recusaram-nos a prioridade porque isso seria pretexto para ultrapassarmos todos os mais. Citámos o exemplo do Brasil em que os idosos têm prioridade. Sem sucesso. Invocámos o facto de estarmos na iminência de perder a conexão, o voo de ligação para Itália. Não se deixaram comover.
Resultado: perdemos mesmo o voo de ligação. Estivémos mais de 5 horas nas filas do aeroporto.
A imagem de um País, de que tanto gostamos, sai chamuscada com incidentes destes e as horas a fio nas filas de espera para uma simples conferência de passaportes.”
Lamentável, observação nossa!
Portugal sempre alinhou, em matéria de atendimento, nas preocupações com as pessoas com deficiência ou incapacidade, os idosos, as gestantes, as lactantes…
A lei, que remontava a 1999, para o atendimento em serviços públicos, veio a dar lugar a uma outra – para valer tanto em espaços públicos como privados – em 2016.
Só se excluem do seu âmbito:
– As entidades prestadoras de cuidados de saúde quando, atendendo à natureza dos serviços prestados, designadamente, por estar em causa o direito à proteção da saúde e do acesso à prestação de cuidados de saúde, a ordem do atendimento deva ser fixada em função da avaliação clínica a realizar, impondo-se a obediência a critérios distintos;
– As conservatórias ou outras entidades de registo, quando a alteração da ordem de atendimento coloque em causa a atribuição de um direito subjetivo ou posição de vantagem decorrente da prioridade do registo.

E o que nos diz a lei no que tange a prioridades?
No seu artigo 3.º, a lei que data de 29 de Agosto de 2016, reza assim:
DEVER DE PRESTAR ATENDIMENTO PRIORITÁRIO
Todas as pessoas, públicas e privadas, singulares e colectivas, no âmbito do atendimento presencial ao público, devem atender com prioridade sobre as demais:
– Pessoas com deficiência ou incapacidade;
– Pessoas idosas;
– Grávidas; e
– Pessoas acompanhadas de crianças de colo.
Entendendo-se por:
«Pessoa com deficiência ou incapacidade» – a que, por motivo de perda ou anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo as funções psicológicas, apresente dificuldades específicas susceptíveis de, em conjugação com os factores do meio, lhe limitar ou dificultar a actividade e a participação em condições de igualdade com as demais pessoas e que possua um grau de incapacidade igual ou superior a 60% reconhecido em Atestado Multiúsos;
– «Pessoa idosa» – a que tenha idade igual ou superior a 65 anos e apresente evidente alteração ou limitação das funções físicas ou mentais;
– «Pessoa acompanhada de criança de colo» – a que se faça acompanhar de criança até aos dois anos de idade.
A pessoa a quem for recusado atendimento prioritário pode requerer a presença da autoridade policial a fim de remover tal recusa e para que tome nota da ocorrência e faça chegar à entidade competente a correspondente queixa.
A hipocrisia da lei assenta no facto de se fazer depender a prioridade do julgamento que o atendente faça da evidente alteração ou limitação das funções físicas ou mentais do idoso.
E do abuso que se traduz, contra o que a lei dispõe, na exigência da apresentação para o efeito de um atestado multiúsos no que aos idosos respeita.
Há que pôr cobro a estes desvios que não honram nem quem legislou, alheio às realidades, menos ainda quem se arvora em juiz de ocasião ou em perito médico ao avaliar as alterações ou limitações das faculdades dos idosos, numa autêntica aberração de proscrever.
Haja um mínimo de decoro!

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