Memórias e afectos – Minha família… em tempos idos

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Faço parte de uma geração que pertence “a outros tempos”, mas que, com mais ou menos dificuldade vai acompanhando os tempos que correm.
Em Abril de 1974, tinha 31 anos, vivia em França, e era o mais velho de seis irmãos, um dos quais, entretanto, falecido. Meu pai também se finou em 1965. Minha mãe em 1997. Nunca foram militantes políticos, porque antes do 25 de Abril não era permitido. De outro modo, sofreriam as consequências do regime deposto do Estado Novo de Salazar. Meu avô paterno, único que conheci, ainda criança e, com quem dormia nos tempos de aluno da escola primária, mantinha, se bem me lembro, uma relação de amizade com o nosso rei D. Manuel ll — “o Patriota” — dizia-me ele quando na 4ª classe estudava a história de Portugal. Era um “feirante” que vendia roupa de homem nas feiras de Ponte de Lima, Ponte da Barca, Arcos de Valdevez e Viana do Castelo, confecionada em casa por ele, por meu tio e meu pai. (Todos ainda vivos nessa época). Eu e meus irmãos crescemos no século XX como qualquer outra família da pequena burguesia entendida como classe média. Educados para sermos bons alunos, respeitar os mais velhos, cumprimentar as pessoas, não ser “malcriado” e ir à missa e à reza do terço aos domingos à tarde. Apenas um senão de que me lembro, a escola primária era de pé descalço. Quando meu avô partiu, teria 12 anos. Foi uma dor incomensurável. As avós, nunca as conheci. Ficaram muitas histórias com meu avô e, destas, as mais saborosas são as que com ele vivi. Férias, passeios, viagens, nem pensar. Recordo que vim pela primeira vez a Viana do Castelo quando tive de fazer o meu exame de 4ª classe na escola do Carmo.
Crescemos sem muita consciência do valor das vivências, e só nos damos realmente conta desta dimensão no momento de uma “partida”…
Entretanto, fomos crescendo. Mudam-se os tempos e as existências. Começam os namoros, vem os casamentos, os filhos, os batizados, as comunhões, os sobrinhos, “viramos a página” e os pais vão deixando aos poucos de fazer parte do quotidiano das nossas vidas porque, entretanto, vão precisando que os filhos sejam os “pais” deles, quando da sua recolha a um lar. A desolação! Os encontros passam a ter cada vez mais significado. Perde-se algum “fio à meada”, mas ganha-se a vontade de estarmos juntos.
Esta é certamente uma forma de celebrar os mais próximos, aqueles com quem crescemos em família. É isso exatamente que queremos festejar: o crescer juntos, as aventuras, as descobertas, a solidariedade, a proximidade, a cumplicidade, a entreajuda, a alegria e a tristeza, as histórias, as emoções, boas e más, com raízes e memória.
Enfim. Recordações do passado, em família, no dia dos irmãos, 31Mai2018.

Leandro Matos

(Foto: “Blog dos Alfaiates”)

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