Prelúdio Desafinado

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Aproveito para vos falar de arte. Não de arte em geral, que é um conceito difícil de definir, mas especificamente de pintura. E para falar de pintura, vou falar-vos da mais genial artista plástica que conheço: a minha sobrinha!

Tem apenas três anos de idade, começou a pintar há uma semana, e tem um talento extraordinário para a pintura. Ofereci-lhe um bloco gigante, pincéis, tintas, e os resultados têm sido simplesmente geniais. Verdadeiras obras de arte que – na minha opinião totalmente parcial – poderiam ter lugar em qualquer galeria de arte moderna. Enquanto apreciador de arte, fascina-me o uso que ela dá às cores, o traço aparentemente caótico, os círculos imperfeitos, de uma expressividade e maturidade impensáveis para uma criança desta idade, na linha dos grandes nomes da arte moderna, como Cy Twombly, Joan Mitchell, entre outros. Se ela já pinta assim aos três anos, imagine-se quando tiver 10. O céu é o limite! Às vezes interrogo-me: será que é ela que pinta como os grandes artistas, ou são os grandes artistas que pintam com uma criança de 3 anos? Deverão os critérios para um adulto ser os mesmos para uma criança (ou vice-versa)? Não se sabe. Provavelmente nem interessa.

Enquanto escrevia este texto, lembrei-me de um livro que li em tempos. É o brilhante conto literário “Kejserens nye Klæder” (também não consegui pronunciar) de Hans Christian Andersen, que conhecemos com o título “O rei vai nu”, publicado em 1837. Do pouco que me lembro, o conto fala de 2 vigaristas, que tentam enganar e convencer o rei a vestir uma roupa feita com uns tecidos tão especiais, que só as pessoas mais inteligentes os conseguiam ver. Só os intelectualmente superiores (eles) tinham a capacidade e o bom gosto de apreciar aquilo que mais ninguém via. E tanto o rei como o povo, para não passarem por ignorantes, fingiam que viam as roupas ( na realidade não havia roupa nenhuma ). Não quero contar mais, mas aconselho a ler.

Se calhar encontramos neste conto de 1837, um possível paradigma de “obra de arte”. Algo belo, que perdura nos tempos, geração após geração, inabalável, intocável, intemporal. Escrito há quase 200 anos, é tão relevante e atual hoje, como no dia em que foi escrito. Poderemos ver aqui algum paralelismo (não intencional) com o panorama actual da arte moderna (?)

Agora que penso nisso, será a minha sobrinha de três anos um génio da arte moderna, ou será que, no que diz respeito à arte em pleno séc. XXI, o rei também vai nu? Fica ao vosso critério.

Deixo-vos com uma pergunta : A pintura do início…será que é uma obra da minha sobrinha de 3 anos, ou será uma obra de um artista do séc. XX, vendida em leilão, há alguns anos, por 50 milhões de dólares?

A resposta pode parecer óbvia, mas aposto que erraram…

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CRIS DK

artista figurativo autodidata

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