“Se a dança nasceu connosco, não devíamos ser todos bailarinos?” (*)

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As crianças e adolescentes que aprendem danças e cantigas tradicionais, nas escolas, interessam-se em procurar diferentes estilos de música, compreendem melhor o seu corpo e a gerir espaços com os colegas, melhoram a forma como se relacionam, demonstram mais confiança e passam a ter algo mais que os une enquanto turma, enquanto grupo. 

Os seus professores relatam que os alunos passam a ter mais resistência física, melhoram a postura, a flexibilidade, a capacidade de coordenação, a criatividade e a atenção. 

Para além disso, ao dançarem em conjunto, os alunos combatem ideias estereotipadas de atividades para raparigas e atividades para rapazes, combatem certas inibições como o simples dar a mão e, acima de tudo, quando há canto ou dança, há uma razão motivacional extra para virem para a escola, o que, em certos contextos, pode ser muito importante. 

Um pouco por todo o mundo, já existem vários profissionais com muita experiência e conhecimento, que fazem um labor muito importante no âmbito das danças tradicionais, não só através do seu ensino, como na sua investigação, publicando trabalhos que ajudam ao seu registo. 

Estes formadores estão ligados a associações que partilham esses mesmos propósitos e que organizam momentos de convívio dançante entre pessoas de variadas nacionalidades e com percursos profissionais muito diferentes, e inúmeras oficinas de danças tradicionais de todo o mundo, que acentuam o sentido de respeito pela identidade e cultura do outro. Estas estão também focadas em deixar para memória futura e para uso dos interessados, registos escritos e de imagem. 

Há, ainda, associações que têm trabalhado para que novas criações sejam feitas, pois acreditam que só recriando e reinterpretando é possível revitalizar as danças tradicionais. No entanto, sem a ajuda de companhias profissionais e dos seus bailarinos e coreógrafos, esse trabalho é muito mais difícil.

Em Viana do Castelo, ainda estamos um pouco longe de tudo isto, e sinto uma certa resistência a que esse passo seja dado, especialmente pela falta de profissionais inteiramente dedicados a estes propósitos. Mas, se não nos dedicarmos ao ensino e ao registo das danças e cantares tradicionais, elas dificilmente sobreviverão à globalização e à natureza dinâmica das sociedades.

Felizmente, em 2023, surgiu a iniciativa “Festa da Dança – Ciclo de Primavera”, da Câmara Municipal de Viana do Castelo, da Associação de Grupos Folclóricos do Alto Minho e do Casino Afifense, que proporciona a oportunidade de se vivenciar a dança tradicional de forma livre, para além de ajudar os grupos folclóricos a encontrarem-se com experientes formadores, que os podem ajudar a refletir sobre as suas práticas.

Quando chego a uma nova turma (até hoje, só para projetos muito pontuais), normalmente, pergunto quem sabe dançar. Poucos são os que levantam o braço. Se uma hora depois a dançar com eles, volto a perguntar o mesmo, a resposta é unanime, são os braços todos no ar.

A ideia de que se tem “2 pés esquerdos” ou “pés de chumbo”, vem da pouca experiência de dançar de forma livre e espontânea na infância e adolescência e da ideia de que a dança só pode existir no palco, ou para dar espetáculo, só é acessível aos grandes talentos, etc.. A dança, enquanto arte, é extremamente importante, mas a vertente lúdica da dança é socialmente igualmente relevante.

Intervenção em “Ler em Viana”, (A Cantar e a Dançar é que a gente se entende), abril 2023, parte III (*) Inês Fonseca Santos

Mafalda Rego

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