Sons Efémeros… Conceitos do Momento…

Sidónio Ferreira Crespo
Sidónio Ferreira Crespo

O meu primeiro trabalho foi na Delegação de Saúde a executar tarefas ligadas à municipalidade. A seguir, após a realização de concurso público, ingressei no quadro de pessoal da Câmara Municipal, tendo exercido funções na área administrativa. Em Julho de 1961, deixei Viana do Castelo, afastamento que durou mais de meio século, embora visitasse as origens com frequência, principalmente nas datas festivas.

No espaço de tempo que prestei serviço no Município, tive o prazer de acompanhar as actividades desempenhadas pelo Presidente Dr. Araújo Novo, distinto advogado, e com a personalidade que lhe sucedeu, o Dr. Sequeira Campos, um dos melhores médicos, daquela altura, no foro de otorrinolaringologia. Homens do povo a governarem para todo o povo. Aqui os faço lembrar, prestando-lhes a minha homenagem, aliado a um enorme elo de saudade da quadra da mocidade. Eram figuras estimadas no meio local da época, carregados de saber popular e de forte perso­nalidade. Não cultivavam o populismo, o clientalismo, o compadrio e a falsa intelectualidade. A arrogância, o corromper e a prepotência estavam banidas dos seus comportamentos, ao contrário com o que agora se passa em alguns sectores da vida nacional e que os meios de comunicação de massas têm vindo a noticiar. Estavam, sempre, abertos a dialoga­r com toda a gente, porque sabiam ajustar, com o seu estatuto, a convivência humana. Não tinham secretariado ou telefones direccionados, adjuntos, assessores, gabinetes de apoio, além de outras geringonças para manterem os esquemas de base partidária. Um contínuo à porta do gabinete, sempre aberto, na generalidade, à população, sem marcação prévia de horas ou de datas, salvo raras excepções. As reuniões cama­rárias eram todas abertas ao público. As pessoas presentes, que aguardavam, com postura, a altura de poderem colocar os seus problemas, eram ouvidas com atenção e respeito, sendo delineado, desde logo, a via para a possível conciliação. Não existia, também, a figura de vereador a meio tempo ou a tempo inteiro.

Estava em vigor o Código Administrativo, que regulava, com autonomia, quase todo o horizonte autárquico, a contrastar com a actual manta de retalhos legislativa onde imperam antagónicos pontos de vista, conjugado com o equívoco, a omissão, que pode ser aproveitado para ser­vir fins diferentes. Os regulamentos municipais ou as suas alterações não descuravam os direitos adquiridos. Serviam-se das mesmas instala­ções sanitárias dos funcionários. O carro oficial era utilizado, sómente, para práticas específicas. Os cargos de chefia não eram preen­chidos por escolha, a dominar a confiança política. Realizavam-se concursos públicos, periodicamente, a nível nacional. As nomeações estavam separadas da política, marcadamente independentes, dando-se prefe­rência à clasificação obtida nas provas que abarcavam diversas maté­rias.

Na altura, na Praça da República, havia dois cafés em frente um do outro. Um deles era frequentado pelos dois estadistas. Conversa­vam, com abertura, com as pessoas presentes, sem rodeios ou fugas ao cumprimento, rindo e gesticulando, sem tão pouco ligarem à posição que ocupavam. Eram óptimos jogadores de xadrez. O Dr. Campos era um bom apreciador de música, principalmente da clássica. Periodicamente, promovia concertos musicais no Teatro Sá de Miranda, abertos a toda a gente. A maior parte das vezes a lotação esgotava. Encarregava-me de acompanhar os eventos, principalmente, no que tocava aos bilhetes com preços meramente simbólicos. Quem, porventura, alegava dificuldades tinha a entrada garantida e gratuita.

Em sociedade, desde essa conjuntura, decorrido que foi tanto tem po, andamos para a frente, ou retrocedemos em alguns cenários da vi­vência humana? Cada um, por si, democraticamente, saberá decidir, ao iniciarmos o ano de 2021, na esperança de se alcançar tantos objectivos que nos faltam, alguns fortemente essenciais, conjugado com o aparecimento virtuoso da vacina para travar a traiçoeira pandemia do covid-19, que já mostra aproveitamentos laterais a modificarem a ordem das prioridades.

 

Nota: – Esta crónica, por vontade do autor, não segue a regra do novo acordo ortográfico.

 

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