Uma possível leitura política

A. Lobo de Carvalho
A. Lobo de Carvalho

As recentes eleições para o Parlamento Europeu (PE), no que diz respeito ao nosso país, vieram demonstrar que a grande maioria dos eleitores vive, apenas, para o tempo presente, ou seja, preocupa-se tão-somente com os recursos para satisfação das necessidades imediatas, não atribuindo especial importância ao futuro. Desde que tenham um governo que os faça viver na ilusão, sem curarem de saber donde vem a grande fatia dos dinheiros públicos, nem como se irão pagar as dívidas do Estado, nada mais interessa. Completa indiferença, por um lado, e egoísmo, por outro, já que estão em causa as gerações mais novas, que terão de pagar a factura dos imprudentes desmandos cometidos. Mostrando a realidade que o país só tem progredido por causa dos biliões provenientes da União Europeia, é penoso assistir a tão expressivo divórcio dos seus objectivos e não participar activamente na definição das suas políticas, através dos deputados eleitos para o PE.

Penso que os resultados obtidos pelos partidos, ao contrário do que muitos apregoam, não trouxeram alterações retumbantes na distribuição dos deputados, considerando que cerca de 70% dos eleitores não votaram e que, caso o tivessem feito, as coisas poderiam ser bem diferentes. E porquê? Simplesmente porque os eleitores das esquerdas são mais participativos, enquanto que os outros se deixam dominar pelo comodismo, não trocando um bom dia de praia pelo cumprimento de um dever cívico, sendo que neste conjunto se incluem, em maioria, os eleitores do centro-direita.

Mesmo assim, e esmiuçando cada Partido, qual é a realidade? O Partido Socialista venceu as eleições, elegendo, apenas, mais um deputado, passado de oito para nove. Pergunto se isto é um resultado assim tão retumbante ou se as manifestações de alegria desmedida não pretenderão camuflar uma certa azia, considerando que o Primeiro-Ministro e outros membros do governo se envolveram até às entranhas nesta campanha e esperariam algo mais significativo. Só encontro razão para esta expressão de regozijo no facto de ter ficado à frente do PSD, mas convenhamos que não é isto que retira a Portugal os seus problemas.
Quanto ao PSD, a realidade mostra que manteve o mesmo número de deputados das eleições de 2014, ou seja, seis deputados. Perante esta evidência, não vejo onde está o drama para que o presidente do Partido encare este resultado como uma pesada derrota. É certo que não aumentou o número de deputados, mas também é certo qua não perdeu nenhum, considerando, ainda, que desta vez concorreu apenas com o seu programa e contando apenas com o seu eleitorado, enquanto que em 2014 concorreu em coligação com o CDS e pode, até, ter sido beneficiado com alguns votos dos seus eleitores. Admitir este resultado como uma pesada derrota é, para mim, pura estultícia e deveriam os dirigentes nacionais ter mais cuidado com as declarações públicas que proferem, porque ofendem os seus eleitores que foram votar. O PSD não ganhou, mas também não perdeu a sua base de apoio, o que no âmbito do clima político nacional e, também, interno, desde a eleição desta liderança, se pode considerar um facto positivo. Derrota teria sido perder deputados, mas isso não aconteceu.

Relativamente ao CDS, também não tem muito que se queixar, na medida em que elegeu um deputado, no seguimento das eleições de 2014 em que concorreu coligado com o PSD. Eleger um segundo deputado, nas actuais circunstâncias governativas do país, seria sonhar demasiado alto, porque os cidadãos andam anestesiados com algumas políticas sociais.

O grande perdedor foi o PCP, que ficou com menos um deputado, o que deve fazer soar os alarmes internos, mais ainda porque o seu parceiro de união no apoio ao governo aumentou a sua representatividade e o ultrapassou. Acredito que para esta realidade terão contribuído fortemente os discursos gastos do seu líder, que diz sempre o mesmo desde há muitos anos, não evolui nas ideias nem nos métodos e já não consegue mobilizar o eleitorado. Para além do mais, transmite a imagem de desgaste muito acentuada de um partido ortodoxo, velho e fora de uso. Assim, ou o PCP muda rapidamente de líder e transfigura a sua imagem para uma liderança jovem e actual, ou então, à medida que os eleitores da velha guarda forem desaparecendo, vai também ele cedendo o seu espaço à erosão. O actual líder merece todo o respeito pela sua longa combatividade, mas parece estar na hora de passar a pasta, considerando que um PCP moderno faz falta à democracia, não lhe faltando militantes com grandes capacidades e qualidades de liderança.

O Bloco de Esquerda (BE) obteve o prémio da sua combatividade, ao conseguir eleger mais um deputado, que “roubou” ao MPT, facto que deve ser relevado, embora esta agremiação partidária seja uma opositora à União Europeia, mas onde não esconde sentir-se comodamente. Sem dúvida que esta realidade tem muito a ver não só com o mérito da sua militância, que arrasta muita juventude letrada, mas também com a simpatia generalizada dos meios de comunicação social, com os quais estabeleceu uma grande empatia e que, diariamente, lhe dão muita visibilidade nos palcos mediáticos.

Finalmente, o PAN, um Partido que, parecendo querer elevar os animais à categoria de seres pensantes, vem fazendo o seu percurso político, tendo conseguido um feito importante ao eleger o seu primeiro eurodeputado, dele se esperando que lute pela saúde do planeta.

Em resumo, e para concluir, diria que o pior desta eleições europeias foi, de facto, a fraquíssima participação dos eleitores, o que evidencia uma inquietante indiferença por uma entidade política que muito tem dado a Portugal e aos portugueses. Relativamente aos Partidos, e exceptuando o PCP, nenhum deles baixou o número de deputados, relevando-se o PS, BE e o PAN por verem aumentada a sua representatividade. O MPT, que em 2014 elegera dois eurodeputados, foi pura e simplesmente riscado do mapa.

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