Visão nostálgica

Nunabre
Nunabre

Quando a Vida humana brota (produto do Amor ou apenas da Libido), é como nova alvorada de sol-nascente, irradiando luz ­- símbolo de esperança…!

É Primavera na idade…!

A seguir, volvidos alguns anos de Infância buliçosa e mais uns tantos anos de Adolescência questionadora, surgirá, radiosa de esplendor, a estação do Verão, com céu azul, calor sem brisa, amplexo doce de terra e mar…! É, na escala etária do Homem, a época da meia-idade, da meia-viagem percorrida ou apogeu inebriante de sonhos realizados ou planos feitos-vida…!

Mais uns meses e eis que o Sol parece amuado, as árvores mostram-se tosquiadas nas copas, dia e noite batendo-se em duelo pela maior durabilidade, enquanto a temperatura, morna ou fria, não sabe a quem dar a vitória….

É o Outono do ano-natural, símbolo do Homem já mais maduro, mais realista, menos sonhador, mais rendido ao agridoce-prazer de olhar-em-frente, vendo em espelho paralelo, um Passado que não volta…!

Eis que, pouco tempo depois, a neve da serra aparece e surgem as chuvadas traiçoeiras, as nortadas já com gumes, abrindo portas à entrada do Inverno, ao mesmo tempo que nos ares soam timbres de marcha-fúnebre…!

É, na marcha etária do Homem, o símbolo da Decrepitude, da derradeira etapa, do epílogo da obra-escrita com a vida, da Sinfonia composta e executada, o ponto-de-encontro entre Aquém-Além, vistos apenas pelos detentores e manuseadores do telescópio chamado Fé…!

Porquê? E para quê? – perguntará o meu prezado Leitor – esta curiosa introdução da presente crónica!? Passo a justificar:
Acabei agora de reler, mais uma vez, o romance “OS MAIAS”, do nosso mestre Eça de Queiroz (1845-1900). Obra volumosa, difusa, emaranhada e nada fácil ao leitor vulgar, é valiosa na sua mensagem de crítica social, mormente das classes-de-elite e alta-roda, onde hipocrisia e desmandos de Ética bem reclamavam correctivos… A Educação nem tudo consegue…!

A obra anda à volta de uma Família riquíssima e de alta estirpe- “Os Maias”. O avô – Afonso e esposa têm um filho – Pedro – educado mais pela mãe – casa com uma mulher contra vontade dos pais dele: nascem duas crianças (Maria Eduarda e Carlos) e a mãe atraiçoa o marido – Pedro – fugindo com amante e levando consigo a filhinha de tenra idade e deixando para trás o filho varão – Carlos, agora total e exclusivamente entregue aos cuidados rigorosos do avô – Afonso da Maia. Vai ser educado à inglesa, com preceptores, contactos com a Natureza, educação física, estudos superiores (Médico), vida farta…!

Sonhando com glórias, rodeado de grandes amigos da vida-airada, frequentando ambientes de luxo e sem critérios, Carlos da Maia vai viver a vida a seu bel-prazer, aquém e além fronteiras… Um dia, vai ser chamado para uma criança que está doente e cuja mãe, vinda de cidades europeias, vive em Lisboa, ausente do amante emigrado nas Américas… Peripécias, várias e variadas, vão desembocar finalmente num amor-paixão entre Carlos e Maria Eduarda (a mãe da criança), sem que os dois apaixonados, nem de longe nem de perto, suspeitem serem os dois irmãozinhos, separados e nunca mais vistos desde os remotos anos da separação… Mar venturoso de pouca dura!
Podendo e pensando casar (o amante de Eduarda abandonara-a definitivamente), eis que um dia, rebenta a bomba: alguém lhes revela que os dois são irmãos-uterinos…!

Drama terrível que não sufoca a paixão…! E agora…!? O vulgo já fala, os amigos não sabem aconselhar, o avô-Afonso, já velho e roído de tristeza e desgosto por tal furacão-familiar, não aguenta e morre, deixando o neto querido (Carlos) mergulhado numa angústia de coração e alma…!

Tendo já apoiado economicamente a irmã Eduarda, aconselha-a a regressar com a filhita a Paris, onde ela e mãe (sua e de Carlos) já tinham vivido, antes, em vidas desvairadas… Entretanto ele, apesar de vaguear por cidades estrangeiras, regressa finalmente às origens, onde reencontra o velho amigo – Ega – e passam os dois a fazer uma espécie de balanço aos sonhos e trambolhões da vida em que fracassaram…! Escutemos alguns desses desabafos de sol-poente
– Falhámos a vida, menino! -(Ega).

– “Não vale a pena viver…… deixaremos este bocado de matéria organizada que se chama o Eu ir-se deteriorando e decompondo…” (Carlos)

Assim termina, em profunda desilusão, o último rebento de “OS MAIAS”, deixando o Mundo nada melhor, visto à luz do Poente!

Foto: “Agenda Barcelos”

Outras Opiniões

Os leitores são a força e a vida do nosso jornal Assine A Aurora do Lima

O contributo da A Aurora do Lima para a vida democrática e cívica da região reside na força da relação com os seus leitores.

Item adicionado ao carrinho.
0 itens - 0.00

Ainda não é assinante?

Ao tornar-se assinante está a fortalecer a imprensa regional, garantindo a sua
independência.