Zodíaco ofendido…

José Carlos Freitas
José Carlos Freitas

O exercício de qualquer cargo de natureza política deve suscitar ao seu titular um profundo sentido de missão e de serviço público, abnegação e responsabilidade, honrando, a todo o momento, as superiores funções que, em nome do povo e na observância da Lei Fundamental, lhe são confiadas. Sendo isso, precisamente isso, que se jura solenemente no momento da tomada de posse, torna-se difícil de compreender — e impossível de aceitar — o crónico uso dos mais diversos artifícios, questionáveis estratagemas e vergonhosos esquemas, que permitirão o abuso do sistema que lhes é confiado, do poder que lhes é conferido e, sobretudo, da confiança que se lhes é depositada.
Hoje, é objectivamente mais difícil separar-se o trigo do joio, já que este último parece exceder amplamente o primeiro, inquinando a percepção da qualidade geral da colheita da qual depende, directa e decisivamente, o futuro imediato do país. Trigo fraco e escasso equivale a dizer que o “pão” é pouco e de fraca qualidade, e, quando assim é, cedo virá a fome democrática e de ordem pública e o descrédito nas instituições, condição essencial à ascensão das mais diversas correntes populistas emergentes. Com o vinho não é diferente. Demasiada parra de promiscuidade e de interesses pessoais para a pouca uva de responsabilidade produzida indicia que o vinho servido à mesa dos portugueses é, também ele, de qualidade sofrível, avinagrado, até. É verdade que “nem só de pão e vinho vive o Homem”, mas o facto é que também não vai longe sem os ditos. Acredito que, considerado este panorama, nem Cristo faria cá a última ceia, com tão fraco vinho e tão seco pão que, de tão intragáveis que são, certamente só o diabo os poderá ter amassado.
A ainda periclitante situação económica e social do país, demasiado permeável a constipações conjunturais e sistémicas, assim como a inusitada onda de populismo emergente, não se compadecem com défices de confiança nas instituições públicas, judiciais e reguladoras, aconselhando-se, por isso, prudência, se não mesmo de decoro, por parte de todos quantos integram os órgãos de soberania da Nação. É isso que tem acontecido? Não, não é. Ou talvez seja, às vezes. Mas não chega. Não pode chegar…
Sabemo-lo bem: à mulher de César não lhe basta ser séria, tem que parecê-lo. Já alguns inquilinos da casa maior da nossa democracia não parecem ser sérios simplesmente porque, ao contrário da tal mulher de César… não o são. E são vários — e fundados — os indícios de tal presunção. Dos inacreditavelmente ardilosos (mas infantis e vergonhosos) artifícios recorridos para legitimar o (ab)uso de direitos concedidos, com o fito único de sacar mais uns “cobres” a um sistema já de si generoso — através da apresentação de moradas falsas e de despesas de deslocação inexistentes, ou de registos de presença forjados “inadvertidamente” por um incauto colega que, coitadinho, se enganou — à sistemática promoção de tricas pessoais estéreis e inconsequentes, muitos são os exemplos de actos que desrespeitam a instituição e que evidenciam que a moralidade, os bons costumes e o tal sentido de missão e de serviço público, abnegação e responsabilidade há muito lá não moram.
Sim, perante tudo isto, só não sou uma “virgem ofendida” porque nasci em Novembro. Sou sagitário, e sim, sinto-me ofendido. Como o resto do Zodíaco, aliás…

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